quarta-feira, 11 de março de 2009

Clareza

rio-me de olhos partidos neste instante de ser a sós,
sem bússola nos dentes
nem reflexos em mente.

entre mim e a minha memória já pouco resta para dizer.
estão gastos os diálogos, gastos e inactivos.
gastos e submersos nos seus sonhos de morte.
jamais, eu sei,
as minhas palavras terão um destino para além de si mesmas.
eu sei, eu vejo, eu sinto,
percebo que permanecerão tão invisíveis
como o ar que respiro nesta clareza abrupta
que ateia o princípio da tarde.
mas persistem,
ainda assim renascem-se e sublevam-se
e afloram-me à boca e à página.
persistem e viajam,
nómadas na ponta dos meus dedos,
nómadas como o teu ser todo,
mesmo quando o calafrio da noite despovoada
te entorpece o corpo inerte,
nómadas em demanda de um rio
que desagúe no teu coração.
às vezes,
quando o sol se deita,
oiço o teu esqueleto respirar na sua brancura de osso.
não sossega e desassossega
a minha húmida noite de musgo e solidão.

melhor me rirei pela manhã?