sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Uma cortante melancolia

entorna o mundo nas minhas veias
uma cortante melancolia
que tudo toma
e torna orações em gritos,
sufocando-me o riso à nascença, abaixo da garganta,
até me alcançar o coração,
sinfonia movida a címbalos e tambores de carne e sangue.

colhendo dela as minhas eternas ambições
(transformar os meus beijos no pão que te alimenta,
os meus braços no teu vestido,
os meus pés no teu caminho,
a minha pele nos teus sentidos,
lembro-me então que a felicidade tem um nome
(é o teu
e consigo, a custo, devolvê-la ao mundo,
escondida no perfume da vida
que ponho a dançar nos meus versos.

não tenho porém sabedoria que chegue
para me afundar no teu corpo quando não me espera
e fazer do teu sono fechado,
onde nenhuma melancolia do mundo cabe,
o meu abrigo.

sábado, 8 de setembro de 2018

Sem nome

acordas nos meus braços
sem vontade de largar os sonhos, momentaneamente
esquecida da magia do real,
a única que importa.

lânguida, dolente,
voltas-te para o outro lado
e quase sorris,
desligada das sensações mundanas,
fracas por definição,
e enganadoras,
demasiadas vezes,
no passado.

depois estremeces
e recordas-te do amor
ontem aceso
nos nossos corpos,
táctil como mais nada,
em lençóis de gemidos envolvido,
e dizes o que aprendeste
recentemente,
que a vida te dá o que tu dás à vida.

atira-te a ela sem hesitação,
continuas,
não temas um sofrimento
que não podes saber se virá
(e se vier
come-o com a boca toda,
como se fosse doce de leite
a barrar a minha pele
numa vertigem de prazer.

o amor há-de,
naturalmente,
sem rodeios nem alarido,
mostrar-te o seu poder,
sólido e determinado
como os soldados devem ser,
como ele ė o tempo todo,
até nas trincheiras da noite,
e trazer-te, nua,
ao meu colo.

toma-me, digo eu,
admitindo pela primeira vez
a utilidade da lua,
das estrelas, dos oceanos,
meus confidentes de sempre e a desoras.

tu obedeces,
de constelações nos dedos,
a ir e a voltar
impreterivelmente,
como as marés.

eu, orgulhosa,
hasteio a bandeira
e ergo um país
de pedra e alegria
entre o meu coração
e o teu
(onde um dia moraremos juntas

vamos chamar-lhe abraço,
mas ambas sabemos que é mais do que isso

e não tem nome.

nomear é
quase sempre
apenas o princípio da viagem.

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Nunca te esqueças

apaixonada pelo teu sorriso,
presa aos teus olhos,
amarrada ao teu ser,
caminho inteira,
toda vestida de verdade,
na direcção exacta do teu abraço,
para me despir
sem temer,
sem sequer um tremor,
na concha das tuas mãos,
quente e salgada
como o mar dos trópicos.

e desato os nós do passado,
esse que não entendes
mas vives à beira de perdoar,
esse em que te não via
senão em sonhos,
sem reconhecer que eras tu que os habitavas.

pelo que digo,
sabes a intensidade do que sinto.
pelo que faço,
conheces a face concreta do que digo.
pelo que dou,
adivinhas a eternidade.

e ficas.

de uma vez.
por todas.

colada ao meu suor,
na minha pele exausta,
na paz do meu coração a chamar por ti,
até de longe,
até do outro lado do mar,
até ao silêncio.

oxalá
nunca deixes de me ouvir,
nem esqueças o mais importante.
a minha língua na tua língua,
sem palavras,
a falar eloquente
como só o corpo sabe.

mesmo sem trazeres o meu retrato ao peito
ou o meu nome tatuado num recanto.

tudo o que o nosso amor precisa
é de tempo

e de um horizonte claro
a acertar-nos o passo.