onde vou ganho raízes
que mesmo sem rega
e em solo que estéril se alardeia
continuam a crescer para o âmago da terra,
enquanto os atrofiados ramos se recolhem
e as folhas em caracol se acastanham
e o tronco seco encolhe sem se vergar.
onde vou ganho raízes.
que o silêncio não mata. só adoça.
e a saudade não corrói. apenas aperta.
esta definhada árvore em permanência
jamais poderá abraçar o sol.
mas reflectirá sempre o seu calor,
alimento de vida. o único essencial.
onde vou ganho raízes
e engulo na noite as luzes que tremem,
as luzes na baixa, as luzes no tejo, as luzes na estrada.
tão rápidas como estilhaços.
sexta-feira, 24 de abril de 2009
quinta-feira, 23 de abril de 2009
Ao espelho
subo à soberba montanha do teu ciúme
vulto de sangue tornada
sem futuro além deste movimento ascendente
que te procura só para te negar
depois do conforto o esqueleto exausto
depois da música o tambor estéril
depois da leveza a lava tóxica
depois da poesia o silêncio repetido
depois do amor o concreto final
o espelho não reflecte o vazio
mas reconhece a perda
vulto de sangue tornada
sem futuro além deste movimento ascendente
que te procura só para te negar
depois do conforto o esqueleto exausto
depois da música o tambor estéril
depois da leveza a lava tóxica
depois da poesia o silêncio repetido
depois do amor o concreto final
o espelho não reflecte o vazio
mas reconhece a perda
terça-feira, 21 de abril de 2009
Não sei se
em cortejo pelas pedras
vão as margens das tardes em que quero morrer
são frias são sujas são de mal
e calcam a calçada que escorrega
gorda de banhas e óleos
como o tempo que me foge.
os barcos na ilha apodrecem
tranquilamente.
as raízes na terra choram
humanamente.
e a vida passa como partem os pássaros quando arrefece.
abrem-se escadas à frente dos meus passos.
não sei se as suba se as desça
não sei se permaneça.
vão as margens das tardes em que quero morrer
são frias são sujas são de mal
e calcam a calçada que escorrega
gorda de banhas e óleos
como o tempo que me foge.
os barcos na ilha apodrecem
tranquilamente.
as raízes na terra choram
humanamente.
e a vida passa como partem os pássaros quando arrefece.
abrem-se escadas à frente dos meus passos.
não sei se as suba se as desça
não sei se permaneça.
quarta-feira, 15 de abril de 2009
Cores
vejo as cores esbaterem-se, diluídas no éter celeste que pela manhã me enlaça. é a minha única hora lúcida, sem remédios do diabo nem venenos divinos, só cheiro a chuva e saudade,
e a ternura toda escondida na dobra do lençol.
poderei renunciar ao meu breve casulo, pergunto-me.
sinto ainda a tua respiração nos ombros, no pescoço o aroma dos teus beijos, nos ouvidos o rumor da tua pressa, nas mãos o teu corpo a tremer.
e um arrepio atravessa-me as costas como um chicote.
então deslizo para fora da cama e abro a janela num gesto teatral.
há vapores de desejo que se elevam, tornados materiais quando os inspiro. têm a sua densidade própria, mas facilmente se moldam aos caminhos do meu interior. e tomam livremente o seu espaço dentro do exíguo espaço que me resta depois dos sonhos da noite. e assolam-me. e indagam-me.
e embriagam-me mais uma vez.
desconexa dou-me então ao mundo,
tornada de novo mulher com cabeça
e destino nenhum para além da linha de partida há muito riscada na minha pele pelo teu punho.
mas por vezes o medo rasga-me a alma.
eu coso-a e refaço-me, coso e aplico-me mais uma lição.
e vejo as cores recuperarem vida nas minhas manhãs.
e acredito nelas e em nós.
mas continuo sem perceber por que o nosso amor
às vezes pende para a terra
como se nunca voasse.
e a ternura toda escondida na dobra do lençol.
poderei renunciar ao meu breve casulo, pergunto-me.
sinto ainda a tua respiração nos ombros, no pescoço o aroma dos teus beijos, nos ouvidos o rumor da tua pressa, nas mãos o teu corpo a tremer.
e um arrepio atravessa-me as costas como um chicote.
então deslizo para fora da cama e abro a janela num gesto teatral.
há vapores de desejo que se elevam, tornados materiais quando os inspiro. têm a sua densidade própria, mas facilmente se moldam aos caminhos do meu interior. e tomam livremente o seu espaço dentro do exíguo espaço que me resta depois dos sonhos da noite. e assolam-me. e indagam-me.
e embriagam-me mais uma vez.
desconexa dou-me então ao mundo,
tornada de novo mulher com cabeça
e destino nenhum para além da linha de partida há muito riscada na minha pele pelo teu punho.
mas por vezes o medo rasga-me a alma.
eu coso-a e refaço-me, coso e aplico-me mais uma lição.
e vejo as cores recuperarem vida nas minhas manhãs.
e acredito nelas e em nós.
mas continuo sem perceber por que o nosso amor
às vezes pende para a terra
como se nunca voasse.
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