quinta-feira, 6 de março de 2008

As ondas

vejo duas ondas breves nos teus olhos, enroladas nesse remoinho bucólico, todo outonal, que de matizes quentes os pinta. vejo-as embrulhar-se em si mesmas e bater nesse branco de espuma raiado de sangue onde a cor se deita. e vejo-as recolher-se a um recanto de águas nupciais, onde todos os elementos finalmente se reúnem e dançam valsas de pés nus.
e o que vejo fala comigo em graça subtil, como o cheiro a chuva e a maresia no cabelo.
irmãs do pranto e da alegria, gota a gota, as ondas inundam céu e terra e escondem-se no mar. lambem os alvos areais e as pedras negras com a mesma desenvoltura. são cadência e surpresa, vertigem e silêncio, verde esmeralda, azul índigo, turquesa, cobalto, transparência.
ansiosas vêm e em saudade partem. como gente.
chegam novas para se esfumarem cansadas, quase adultas. mas volvem sempre, retornadas meninas, além de imensas.
lentas e rápidas e sempre sublimes. como o amor.
e entornam-se na paisagem. e beijam-me difusas. e varrem-me o corpo, brilhantes mas tão etéreas como correntes de ar atravessando abismos.
e trazem-me o teu âmago de algas em flor, a iluminar-se e a escurecer ao ritmo da minha respiração. a molhar-me a fronte e o riso. a abrir-me para o dia.
desagua no meu pulso, digo.
enxuga a minha praia, dizes tu.
e então oferecemo-nos ao oceano, trocamos de pele e flutuamos.

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