sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Para onde

certo dia chega a manhã em que decides recomeçar.
preferes a água ao vinho, a clareza ao vício, o dia à madrugada.
e vais buscar aquele novo chá
que te ofereceram numa festa que já não recordas.

a flor que se abre nas borbulhas do bule parece-te um milagre, ainda que saibas
que o único verdadeiro milagre que conheceste,
teres amado e sido amada,
não voltará a ser mais do que um sopro difuso
na aguda consciência que reconstrois.

e bebes a infusão e recomeças.
leve como música,
as vísceras sobre a mesa, a encolher a olhos vistos
os rios de sede a morrer na garganta
a noite expulsa do sangue
e o desejo (esse antigo manto que bem reconheces,
tão bem como as outras roupas que costumas usar,
a imaginação tecidas e frescas como pedra,
a embrulhar-te de novo,
alheio a versos e aos sonhos adverso.

depois sais para a rua e apanhas a chuva toda.

o silêncio corporiza-se, a porta da casa fecha-se.

e a tua alma desata a correr
para onde trepida a vida.

2 comentários:

ByNature disse...

Para onde? Talvez em busca de um "novo chá".

Berta Cem Mil disse...

Ou talvez sem busca, sentir só.