estou atenta ao borbulhar do tempo e choro lágrimas antigas a todo o comprimento dos dias, oscilando entre o fabrico absurdo da saudade e os actos excessivos da paixão.
descubro deuses na minha infância resumida a uma folha da memória e desenho metamorfoses orgulhosas no fio das palavras livres do passado, onde mal me equilibro, funâmbula e gasta. tanto tombo para norte como para sul e às vezes esbarro nos amplos vestidos de luz onde o teu corpo rodopia como a terra no cosmos.
quando me nasciam poemas dos dedos e tu me acenavas de luvas, as horas eram melhores, quase com a duração justa.
depois saí à rua para esperar por ti e vi-te resplandecer à chegada, de sorriso trémulo mas sem dúvidas nos olhos.
disseste: a apoteose mora no início de tudo.
e eu disse: a chuva da ilusão não molha.
tiraste as luvas, tocaste-me com prudente nobreza, soerguida de um rio de poeira, branca como o deserto, frágil como a pele, toda porcelana e oiro como o pôr-do-sol.
e partiste num assobio navegável.
eu já não encontrei o caminho de volta ao conforto lírico do meu canto. e agora tenho insónias. deito-me cedo para sonhar mais tempo contigo mas oiço-te respirar entre os lençóis e os plátanos e os fios de ovos festivos. e tilintar no escuro como um lustre ao vento. e cintilar nos abraços reclinados sobre a brevíssima unidade que a vida nos consentiu.
o meu coração é um estaleiro de andaimes vibráteis por onde sobem as moléculas operárias do amor, de baldes com entulho ardente às costas e pás de cimento meigo nas mãos, destinado a colar-nos e a reconstruir-nos pedra por pedra num edifício sem limites, onde poderemos ser pássaros aninhados sem pressa. nem vontade de voar.
domingo, 1 de julho de 2007
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8 comentários:
Fantástico!
lilith, fico grata pelo seu entusiasmo. mas tenho pena que seja mulher de tão poucas palavras...
olha, este tamb�m est� muito bonito...
embora se descortine alguns elementos comuns entre as v�rias host�rias, a inova�o que existe em cada uma delas chega sempre para surpreender. pelo menos, para mim. e a chave continua a ser de ouro.
physis, eu sou uma kinder surpresa.
As tuas palavras continuam inspiradoras. É sempre um prazer voltar. Não me parece justo que não possas entrar em minha casa. Escreve (juneinthesky@gmail.com) e envio-te um convite.
june, agradeço a tua visita e o convite. mas confesso que não entendo por que me convidas, se queres manter a casa fechada ao mundo...
Muito Bom. É mesmo verdade a históra da "musa inspiradora". "Aquela pessoa" está em todos os poemas...e não tenho dúvidas que se ela não existisse não produzirias com tanta intensidade. Gosto particularmente do último parágrafo. Acho genial.
A tua amiga secreta!!
Ai, ai, ai!! Estás a revelar-me muito aqui à frente de toda a gente... Assim, dás-me cabo dos arranjinhos...
Mas gostei da parte do "genial"... Que bem que me fez ao ego. thanks!
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